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Debate nas Caldas destaca desafios na conquista dos ideais do 25 de Abril

O Conselho da Cidade - Associação para a Cidadania das Caldas da Rainha promoveu um debate com representantes dos partidos e movimentos políticos que se candidataram nas últimas eleições autárquicas, para refletirem sobre o que ainda falta cumprir das causas do 25 de Abril, tanto nas Caldas da Rainha como no país. O evento decorreu no dia 20 de fevereiro, no pequeno auditório do Centro Cultural e Congressos das Caldas da Rainha.

Os representantes dos partidos BE, CDS, Chega, IL, CDU, PS, PSD e do movimento Vamos Mudar foram unânimes em afirmar que a liberdade conquistada é fundamental, mas sublinharam que, para muitos, a verdadeira democracia passa pela criação de condições económico-sociais que assegurem uma melhor qualidade de vida para todos, incluindo direitos fundamentais como a habitação, a saúde, a educação e a alimentação.

Cinquenta anos após o 25 de Abril, a fome continua a ser uma realidade em Portugal, assim como persiste uma série de desafios, entre os quais se destacam os problemas no Serviço Nacional de Saúde (SNS), a carência de habitação e a escassez de professores. Falou-se do salário mínimo, considerado miserável, e destacou-se ainda a crescente descredibilização da classe política, a baixa participação cívica e a elevadíssima taxa de abstenção nas eleições.

O moderador do evento, o arquiteto António Salvador, iniciou o debate citando uma canção de Sérgio Godinho, que imortalizou, através da arte, a ideia de que “só há liberdade a sério quando houver paz, pão, habitação, saúde e educação”. Para António Salvador, este evento foi um “confronto de ideias”, em que cada força política apresentou uma visão distinta sobre a mesma questão, mas com respostas muitas vezes antagónicas. “Esta é a diversidade, a liberdade de expressão, que, provavelmente, é uma das maiores conquistas do 25 de Abril, entre outras”, salientou.

“Há questões fundamentais que ainda faltam e há muito a fazer e a amadurecer dentro da nossa democracia para as conquistar. Não se trata de um fim, mas de uma etapa”, adiantou o moderador, que destacou as palavras do presidente da República: “Mais vale ter uma democracia frágil do que ter uma ditadura forte”.

Numa noite fria de quinta-feira, o auditório contou com uma boa afluência de pessoas que se quiseram reunir para ouvir e debater a evolução da liberdade desde a revolução, bem como os desafios que se colocam nos dias de hoje.

O debate focou-se em duas questões, às quais cada político teve cinco minutos para responder.

No final, seguiu-se um debate muito dinâmico e concorrido.

 

1ª pergunta: O que falta cumprir das causas do 25 de Abril?

 

Luís Fazenda, dirigente do Bloco de Esquerda, antigo deputado e vice-presidente da Assembleia da República, destacou a necessidade urgente de salvar os serviços públicos essenciais em Portugal, como a educação, a saúde, a segurança social e a habitação. “Democracia não é apenas votar de 4 em 4 anos, é garantir condições económico-sociais que promovam maior igualdade e justiça na sociedade”, afirmou, sublinhando que a luta pela preservação destes serviços é crucial para manter a qualidade da democracia.

Alertou também para o perigo das privatizações nestas áreas, que, segundo ele, levariam à degradação dos serviços públicos. Em relação à paz, fez uma referência à memória da Guerra Colonial e à necessidade de lutar contra a crescente escalada militarista na Europa, mencionando o “conluio” entre Putin e Trump.

O dirigente do Bloco de Esquerda também frisou que, apesar dos avanços desde o 25 de Abril, “Portugal continua a ser um dos países com maior desigualdade social na Europa”, e que é essencial inverter este cenário.

Sofia Cardoso, presidente da concelhia do CDS-PP de Caldas da Rainha, iniciou a sua intervenção recordando os desafios enfrentados nos primeiros 18 meses após o 25 de Abril, destacando que a conquista da democracia não foi rápida nem simples.

Sublinhou que, apesar de tudo, o CDS continuou a defender os seus ideais liberais, focados na criação de riqueza e na distribuição social dessa riqueza. “Somos todos diferentes, mas somos todos iguais. Queremos uma vida melhor, mas também queremos liberdade de escolha”, afirmou. No entanto, alertou para o desfasamento social persistente, que, segundo ela, é agravado pelas políticas de esquerda e pelos ataques à propriedade privada.

Referiu como exemplo a medida do PS em 2023 que obrigou os proprietários a ceder casas para resolver o problema da habitação, uma decisão que considera injusta. “Isto é dizer que uns têm mais direitos do que outros”, declarou. A presidente do CDS/PP das Caldas defendeu ainda que a geração de riqueza deve ser a chave para o progresso e criticou a perseguição aos empresários. “Gerar riqueza implica dar condições aos empresários para que possam pagar melhores salários”, explicou.

José Carlos Faria, ex-candidato da CDU à Câmara das Caldas e membro da Direção de Organização Regional de Leiria do PCP, destacou que o 25 de Abril trouxe profundas transformações, mas também provocou retrocessos a partir de um certo ponto, especialmente com as sucessivas divisões da Constituição. “O que se constata hoje, 50 anos depois, é que a diferença entre ricos e pobres se aprofundou”, afirmou, referindo que cerca de 10% da população portuguesa vive em situação de pobreza, o que equivale a aproximadamente 2 milhões de pessoas.

O membro da CDU sublinhou que, por exemplo, um casal com dois filhos que receba o salário mínimo está, na realidade, “mergulhado na pobreza”. Lamentou também a falta de foco nos mais desfavorecidos no discurso político atual.

Em relação às Caldas da Rainha, José Carlos Faria mencionou problemas crónicos, como a situação calamitosa do Centro Hospitalar do Oeste, os constantes atrasos nas obras da linha do Oeste e o problema do assoreamento e poluição da Lagoa de Óbidos. “Vemos os mesmos problemas ano após ano, sem que as soluções sejam sequer enunciadas”, afirmou.

Por fim, abordou a necessidade da luta pela paz, indicando que “vivemos tempos muito escuros e preocupantes”.

Luís Paulo Fernandes, presidente da Distrital de Leiria do Partido Chega e deputado na Assembleia da República, abordou a falta de cumprimento do 25 de Abril e do 25 de Novembro de 1975, afirmando que, 50 anos depois, a maioria dos portugueses tem a noção de que há muito por cumprir.

Sobre a construção do novo hospital, criticou o que considera ser o aproveitamento e jogo político de bairrismos e divisões entre concelhos. “Ficamos a discutir se o hospital será nas Caldas ou no Bombarral, mas ninguém investe no que temos e não temos médicos. Isso é como ter oficinas sem mecânicos”, afirmou.

O deputado do Chega considera que, após 50 anos, a situação do Hospital do Oeste é uma “vergonha”, devido ao impasse entre governos do PS e do PSD. “

Criticou a falta de ação e a promessa de resolver o problema do hospital, afirmando que os portugueses estão fartos de promessas não cumpridas. “1 milhão e 200 mil portugueses votaram no Chega porque estão fartos de promessas que não são cumpridas”, disse.

O deputado apelou à participação cívica e à indignação da população para pressionar os partidos políticos a unir esforços e resolver de uma vez por todas o problema do Hospital do Oeste.

Mário Amorim Lopes, deputado na Assembleia da República da Iniciativa Liberal, destacou que “falta cumprir um projeto para o país”. Segundo o deputado, “Portugal está cada vez mais lateralizado” e, apesar de sermos um país pequeno, há nações menores, como a Suíça, Bélgica, Holanda e Irlanda, que são mais prósperas. Atribui isso às “escolhas políticas erradas” feitas ao longo do tempo e não ao tamanho do país.

No seu entender, o 25 de Abril foi importante para a liberdade, defendendo que, com as políticas certas, Portugal pode “ombrear com outros países ricos da Europa”.

Mário Tavares, militante número 1 do PS nas Caldas e com mais de 30 anos na Assembleia Municipal, refletiu sobre as dificuldades que viveu antes do 25 de Abril, destacando a falta de liberdade e as grandes carências da época. Afirmou que “não se vive na Europa atualmente um tempo de euforia”.

Em relação à cidade das Caldas, Mário Tavares apontou a necessidade de mais ensino e habitação acessível. O socialista destacou que, embora a diferença de classe fosse muito grande no passado, “hoje todos somos livres”, mas alertou para o afastamento das pessoas dos órgãos de decisão.

Jorge Varela, professor de Direito e ex-presidente da União de Freguesias de Santo Onofre e Serra do Bouro, fez uma analogia entre democracia e teatro. Comparou a ditadura a um palco em que “alguém, pela força, tomou o palco” e determinava como a cena política se desenrolaria. Em contraste, na democracia, “quem assiste à peça política, de 4 em 4 anos, escolhe os atores”, o que define a democracia representativa. No entanto, o social-democrata destacou que a Constituição Portuguesa vai além, prevendo também a “democracia participativa”, onde o povo não é apenas espetador, mas também tem voz ativa, sendo convidado a subir ao palco e participar da peça.

Argumentou que falta ainda uma etapa do 25 de Abril: que as pessoas não só participem da peça política, mas também sejam autoras da sua própria história, influenciando o fim e o rumo da peça. Sugeriu que “o próprio povo deve responsabilizar-se pelo fim da peça”.

 

“O Hospital não é uma questão de bairrismo”

 

Vitor Marques, presidente da Câmara Municipal das Caldas pelo Movimento Vamos Mudar, respondeu ao deputado do Chega, abordando o tema da construção do novo hospital do Oeste salientando, que “não há disputas entre concelhos, nem guerrilhas. O que é necessário é que alguém tome a decisão, e essa responsabilidade cabe ao Estado Central, que deve definir a localização”. “O que nós, nas Caldas, fazemos é defender o interesse da nossa população e do concelho, mas sempre em sintonia com os interesses do Oeste e do país como um todo, conforme o Plano Hospitalar Nacional”, vincou.

Frisou que, apesar de haver hospitais no passado, nem todos os portugueses tinham acesso à saúde, e hoje, embora haja mais hospitais, ainda há a necessidade de novos.

Sobre a educação, comentou que, embora haja mais professores, alguns estão a lecionar disciplinas para as quais não foram formados, o que não é ideal.

Em relação à habitação, apontou que há falta de capacidade financeira para muitos cidadãos adquirirem casas ou pagarem rendas, apesar de nas Caldas existirem cerca de 11 mil casas à venda.

Afirmou que a missão deveria ser maior em termos de participação cívica, enfatizando a importância de sermos mais participativos na construção do futuro.

 

2ª pergunta: O papel das forças políticas no reforço dos valores do 25 de Abril

 

A segunda questão colocada foi o que pode cada uma destas forças políticas fazer para reforçar os valores e ideais que o 25 de Abril nos deixou, tanto nas Caldas da Rainha em particular, como no país em geral?

Luís Fazenda, do Bloco de Esquerda, sublinhou que, enquanto na ditadura o povo era refém, na democracia ele é cidadão. Destacou que é necessário cumprir a Constituição e avançar, “priorizando o interesse público, em vez de seguir o capitalismo selvagem, que não é adequado para Portugal”. Para o militante do BE é essencial “fortalecer os direitos sociais, melhorar a distribuição de rendimento, aumentar a produtividade e garantir serviços públicos de qualidade, com um foco particular no Serviço Nacional de Saúde (SNS)”.

Luís Fazenda frisou que o SNS é fundamental para “garantir igualdade e solidariedade social, e não deve ser desmantelado ou privatizado”. Lamentou que “corra o risco de ficar restrito aos mais carentes”.

Por fim, apontou a necessidade de “encontrar soluções europeias que não asfixiem o país financeiramente ou o envolvam em aventuras militares indesejadas”.

Sofia Cardoso defendeu que é necessário aumentar progressivamente o salário mínimo para que o país avance. Contudo, alertou que o país não pode depender exclusivamente dos salários mais baixos para financiar o Estado. Destacou a situação da classe média, que tem visto o seu poder de compra diminuir, e afirmou que não combater a pobreza apenas gera mais pobreza.

Criticou a falta de ambição nos governos, especialmente em relação a reestruturações fiscais e dos serviços públicos, que considera necessárias para cumprir os valores do 25 de Abril. No contexto das Caldas da Rainha, apontou as dificuldades do concelho, como a falta de modernização da Linha do Oeste e as deficiências nas políticas de saúde. Defendeu a necessidade de captar mais investimento, incluindo no setor industrial, e apoiar os agricultores locais.

Para a presidente do CDS-PP das Caldas, a abstenção é um dos maiores problemas em Portugal, e apelou à participação cidadã, destacando a importância de votar nas próximas autárquicas para decidir os destinos das Caldas da Rainha.

José Carlos Faria alertou para “o ataque em curso ao SNS”, defendendo que “é necessário impedir o desmantelamento dos serviços públicos”. Lembrou que, durante a pandemia de Covid-19, o SNS foi essencial, já que os hospitais privados “sacudiram a água do capote e passaram os doentes para os públicos”.

Em relação ao Hospital do Oeste, o elemento do PCP destacou que, apesar das discussões, não há garantias orçamentais para a sua construção. Afirmou que as verbas necessárias para o hospital não estão incluídas no Programa de Investimentos de 2020-2030, o que considera “um grande erro”.

No tema da habitação, o membro do PCP frisou que “o problema é a especulação imobiliária, que tem levado a aumentos excessivos dos preços”. Criticou ainda a ideia de que não há dinheiro para “resolver todos os problemas”, sublinhando que, muitas vezes, o que falta é “vontade política”. Referiu ainda que “quando há essa vontade, o dinheiro aparece”, citando os milhões injetados na banca como exemplo.

Destacou que não se combate a pobreza com salários baixos, defendendo o aumento de salários e pensões como uma medida essencial para combater a pobreza em Portugal, onde se “empobrece a trabalhar”.

Luís Paulo Fernandes manifestou que “a união só é possível quando se deixa de pensar em benefícios partidários e se coloca o bem comum em primeiro lugar”. Referiu que o Chega “não tem vergonha de votar ao lado do PCP ou do Bloco de Esquerda, se isso beneficiar os portugueses”.

No que diz respeito às Caldas da Rainha, o deputado expressou preocupação com a segurança na cidade. Realçou também a “falta de preparação para lidar com a imigração e salientou ainda que a justiça em Portugal “não funciona”.

Lamentou que, enquanto os “imigrantes recebem mais apoio e direitos, os portugueses, especialmente os que contribuíram toda a vida, se sintam negligenciados e insatisfeitos”.

Mário Amorim Lopes criticou a ideia do PCP de que basta aumentar salários, enfatizando que é necessário gerar riqueza para poder distribuí-la. Destacou que “o capitalismo foi o sistema económico que mais prosperidade gerou, embora com desigualdades, que devem ser corrigidas”. Apontou exemplos como a Irlanda, que, “apesar de dificuldades passadas, hoje é um dos países mais ricos da UE devido às reformas que implementou”.

O deputado também argumentou que Portugal tem potencial para criar mais riqueza, o que resultaria em melhores salários, pensões e qualidade de vida. Para alcançar mais prosperidade e liberdade económica, defendeu “políticas públicas que incentivem o crescimento, inovação e capacidade tecnológica”.

Mário Tavares destacou a importância da liberdade e da democracia, dizendo que, “se não estamos satisfeitos, temos sempre a possibilidade de fazer novas escolhas e de fazer ouvir a nossa voz”.

Sobre as melhorias significativas nas Caldas desde 74, focou o saneamento básico, a melhoria das escolas e a distribuição de alimentação para as crianças. Lembrou como era a vida há 50 anos, quando o saneamento e as infraestruturas eram quase inexistentes.

Concordou com o aumento da insegurança, sugerindo que isso poderia “estar relacionado com a imigração desordenada”. Contudo, acredita que “esses problemas poderiam ser resolvidos facilmente, desde que tratados de forma séria”.

Jorge Varela não concorda com a associação entre segurança e imigração, afirmando que “devemos ter muito cuidado com os imigrantes pois são necessários para o país”. Defendeu “políticas de integração e inclusão inteligentes, considerando que quem imigra “quer ter melhores condições de vida e, por isso, não quer perturbar o sítio para onde vai”.

Sobre as relações laborais, destacou a importância de uma “relação simbiótica” entre empresários e trabalhadores, onde ambas as partes têm a ganhar. Afirmou que, se as empresas oferecerem melhores condições, “a produção aumenta e o empresário ganha”.

Em relação à democracia, alertou que “se nós nos deixamos ir nesta onda dos ataques aos partidos políticos, é a porta de entrada para as ditaduras”, acrescentando que “os partidos políticos são essenciais à democracia”, mas também precisam de “democracia dentro deles próprios”.

Vítor Marques defendeu a necessidade de ampliar a economia, através da formação e da educação, criando condições para o seu funcionamento. Salientou a importância de um equilíbrio entre o público e o privado, como demonstrado pelo processo pós 25 de Abril, onde as duas partes funcionaram em conjunto.

Considera que a burocracia é excessiva e que “cada dia que passa não há rentabilidade do investimento do nosso tempo”.

Sobre a justiça, criticou a lentidão dos tribunais, apontando que a demora nas respostas “é inibidora daqueles que possam querer investir”.

Também destacou a necessidade de melhor planeamento e gestão, referindo exemplos como o desperdício de dinheiro com alugueres de contentores, como no caso do hospital, onde “estamos a pagar aluguer de contentores há mais de 20 anos e já se tinha feito obra”.

Relativamente à segurança, o presidente da Câmara afirmou que “o aumento da população pode agravar o risco de insegurança”, mas destacou que “o índice de criminalidade em Portugal não é maior entre os estrangeiros que nos portugueses”. Defendeu a inclusão dos imigrantes, lembrando que “precisamos deles para trabalhar”.

O presidente do Conselho da Cidade, Luís Filipe, destacou a importância do tema e relembrou que realizaram no dia 24 de abril do ano passado um evento sobre a revolução dos cravos. “Tínhamos previsto a realização de um segundo evento, no qual gostaríamos de questionar os partidos políticos em Portugal sobre a sua opinião sobre o estado do 25 de Abril, 50 anos depois”, afirmou Luís Filipe.

Apesar das dificuldades, o evento foi finalmente realizado, mas, como explicou o presidente, “infelizmente, só conseguimos concretizá-lo agora, em fevereiro de 2025. Deveria ter acontecido no ano passado, e é por isso que mantivemos o nome ’25 de Abril, 50 anos”.

 

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