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Estou no 9º ano, e agora? O desafio de escolher a área aos 14 ou 15 anos

Filipa Miguel tem 15 anos e frequenta o 9.º ano numa escola do concelho das Caldas. Considera-se uma boa aluna, não excelente, mas razoável, com notas entre o 4 e o 5. Desde pequena que se sente atraída pelo mundo das artes e reconhece-se como uma jovem criativa. Gosta de desenhar, de criar roupa, de imaginar. No entanto, quando pensa no futuro, não faz ideia do que quer ser. Está indecisa, sem rumo certo. Apesar da afinidade com as artes, não se vê a seguir essa via profissionalmente. Já ponderou seguir Psicologia ou até ser veterinária. Agora, hesita entre os cursos de Ciências e Tecnologias e Economia.

Na escola, fez os habituais testes psicotécnicos com a psicóloga, mas sentiu necessidade de mais apoio. Pediu à mãe para se inscrever num programa externo de orientação vocacional, na esperança de tomar uma decisão mais consciente. A ansiedade de ter de escolher tão cedo o caminho académico e profissional é uma realidade partilhada por muitos jovens como ela.

A entrada no ensino secundário marca um momento crucial de decisões: qual área seguir? Ciências? Artes? Línguas? Curso Profissional? Para muitos adolescentes, esta escolha é envolta em dúvidas, inseguranças e até medo das consequências de uma eventual má decisão.

O Jornal das Caldas ouviu psicólogos e diretores dos agrupamentos de escolas da região para perceber como se pode apoiar os alunos nesta fase de escolhas. A principal mensagem deixada é que nenhuma decisão é definitiva. A escolha feita aos 14 ou 15 anos não tem de ditar o futuro para sempre, mas deve, sim, ser feita com consciência e autoconhecimento.

A psicóloga Suse Sofia Rita, que tem o mestrado em Psicologia da Educação, Desenvolvimento e Aconselhamento e é diretora psicopedagógica da MSC Brain Academy, nas Caldas, explicou que a orientação vocacional “nesta fase é essencial para ajudar os jovens a fazerem uma escolha mais informada e refletida”. “Permite explorar os seus interesses, valores e aptidões, reduzindo a ansiedade e aumentando a confiança na transição para o ensino secundário. Também contribui para evitar desistências futuras e promover o bem-estar académico e emocional”, adiantou.

Quanto aos sinais ou indicadores que um aluno pode observar em si próprio para começar a refletir sobre a escolha da área no 10.º ano, a psicóloga disse que deve “prestar atenção às disciplinas que mais o motivam, ao tipo de tarefas em que se sente mais confortável e aos temas que o entusiasmam fora da escola”. “Refletir sobre a forma como gosta de aprender e o que faz com gosto no dia a dia são pistas importantes. Tudo isso ajuda a construir uma imagem mais clara de si próprio”, relatou.

Para Suse Sofia Rita o apoio especializado permite “estruturar o processo de decisão, diminuir a ansiedade e promover o autoconhecimento”. “É muito comum haver dúvidas ou insegurança e o papel do psicólogo é justamente ajudar o jovem a clarificar o que faz sentido para si”, alertou.

A Brain Academy oferece orientação vocacional em psicologia, utilizando uma “abordagem individualizada”. “Começamos com uma entrevista inicial, seguimos com sessões de aplicação de testes psicotécnicos cientificamente validados e análise dos interesses, valores e aptidões. Por fim, fazemos a devolução dos resultados com relatório e reflexão conjunta, envolvendo o aluno no seu processo de decisão”, referiu.

A psicóloga afirmou que tem havido um aumento significativo da procura. “Os pais estão cada vez mais conscientes da importância de apoiar os filhos nesta fase. Procuram garantir que a decisão seja refletida, evitando escolhas precipitadas ou baseadas apenas em influências externas”, descreveu.

Suse Sofia Rita declarou que “os psicólogos escolares fazem um trabalho notável, mas têm muitos alunos a seu cargo”.

No centro onde exerce, oferece um acompanhamento mais personalizado, composto por “quatro a cinco sessões de cerca de uma hora, ajustadas ao ritmo de cada jovem”. O serviço, com um custo de 200 euros, inclui entrevista inicial, aplicação de testes, sessões ilimitadas, relatório final e apoio posterior.

Segundo a psicóloga, muitos jovens sentem-se pressionados a fazer “a escolha certa”, o que pode gerar “ansiedade e bloqueios”. Defendeu que o papel do psicólogo é “normalizar essa incerteza e criar um espaço seguro de reflexão”. E reforçou: “Como costumo dizer, não é uma sentença. Se mais tarde precisarem de ajustar o caminho, também faz parte do processo”.

Apesar de o sistema educativo permitir reorientações ao longo do percurso, Suse Sofia Rita destacou a importância de uma escolha ponderada no final do 9.º ano. “Quanto mais informada e consciente for a decisão, maior será a probabilidade de sucesso e bem-estar no percurso académico”, vincou.

“Ninguém precisa de ter tudo decidido aos 14 anos. A escolha deve basear-se no que faz sentido para si, não no que os outros esperam. Ainda há muitos estereótipos – como “Ciências é melhor” ou “Artes não tem saída” – e pressões externas. O importante é ouvir-se a si próprio”, aconselhou Suse Sofia Rita.

“A orientação não é dizer o que escolher, mas ajudar o jovem a desenvolver autoconhecimento e sentido crítico. O mais importante é que se sinta protagonista do seu percurso e tenha ferramentas para tomar decisões informadas e alinhadas com o que se identifica e ambiciona”, concluiu a psicóloga.

 Orientação vocacional nas escolas

O JORNAL DAS CALDAS contactou os diretores dos agrupamentos de escolas das Caldas da Rainha, Óbidos e São Martinho do Porto para saber que medidas estão a ser tomadas no apoio aos alunos nesta fase desafiante de escolha vocacional. Alguns dos diretores responderam diretamente, enquanto outros solicitaram a colaboração das psicólogas escolares, que explicaram os programas de orientação vocacional em vigor nos respetivos agrupamentos.

O diretor do Agrupamento de Escolas Raul Proença, João Silva, explicou que o apoio à orientação vocacional começa cedo e envolve várias estratégias, com o apoio de dois psicólogos. “Os psicólogos realizam sessões ao longo do ano com os alunos, onde abordam as diferentes ofertas educativas e os percursos possíveis, complementando com testes psicotécnicos para ajudar a identificar áreas mais adequadas ao perfil de cada estudante”, referiu o diretor.

Para além deste trabalho técnico, existe também uma vertente prática e testemunhal. “Constituímos equipas com alunos do ensino secundário, de cursos científicos e profissionais, que vão às turmas do 9.º ano partilhar a sua experiência de como fizeram a sua escolha, as dificuldades que sentiram e como está a ser o percurso atual. É uma conversa direta, com espaço para perguntas”, acrescentou.

Quando os alunos demonstram interesse por áreas mais técnicas ou artísticas, como Artes Visuais ou o curso de Gestão e Programação de Sistemas Informáticos, são organizados workshops e visitas a aulas práticas no secundário. “Assim, podem ver por dentro o que se faz em cada curso e tomar decisões mais informadas”, sublinhou.

O envolvimento dos encarregados de educação também é valorizado. “A equipa de psicólogos organiza reuniões com os pais que queiram esclarecer dúvidas sobre o acesso ao ensino superior, disciplinas específicas e saídas profissionais”, contou.

O diretor reconheceu que “há alunos com grande ansiedade e outros que já têm a decisão tomada”. “Mostramos que mudar de percurso não é um drama. Temos casos de alunos que mudaram no final do 10.º ano ou até mais tarde e hoje estão bem e felizes. O importante é saber que há sempre alternativas”, concluiu.

O diretor do Agrupamento de Escolas D. João II, Jorge Graça, explicou que a escola conta com uma equipa de três psicólogos que, no âmbito da orientação vocacional, apoia os jovens na construção de um percurso académico e profissional mais consciente, responsável e alinhado com os seus interesses e aptidões.

Segundo o responsável, é realizada uma avaliação dos interesses e aptidões dos alunos, através de testes psicológicos, questionários com o objetivo de identificar as áreas mais compatíveis com o perfil de cada jovem. Esta avaliação inclui tanto as aptidões gerais como as específicas, de natureza cognitiva.

Após esta fase, é feita a devolução dos resultados, acompanhada de um relatório final, que é partilhado com os alunos e os encarregados de educação, com o intuito de apoiar o processo de tomada de decisão. A cada aluno é entregue um documento com a oferta educativa para o ano letivo 2025/2026, incluindo as opções disponíveis nos diferentes agrupamentos escolares.

Jorge Graça sublinhou ainda que existe um certo desconhecimento por parte dos alunos relativamente às várias áreas académicas e profissionais. Por isso, a psicóloga responsável fornece explicações detalhadas e entrega um documento informativo com todas as alternativas disponíveis.

Sandra Santos, diretora pedagógica do Colégio Rainha D. Leonor, explicou que ali a orientação escolar vai muito além das sessões com a psicóloga escolar. “Ao longo do 9.º ano, proporcionamos aos alunos oportunidades de contacto com entidades, empresas e profissionais de diversas áreas de interesse, para que possam conhecer diferentes profissões, percursos académicos e os respetivos desafios. Por vezes, recebemos os profissionais no colégio. Outras vezes, somos nós que acompanhamos os alunos às empresas”, descreveu.

Para a responsável, “é fundamental apoiar os alunos nas suas escolhas, apresentando-lhes várias possibilidades e reforçando a ideia de que, independentemente da opção que façam no 10.º ano, o mais importante é estarem motivados, empenhados e serem resilientes. Vivemos numa realidade em constante mudança, pelo que é essencial que desenvolvam um leque diversificado de competências ao longo do seu percurso académico”.

Jorge Pina, diretor do Agrupamento Escolas Rafael Bordalo Pinheiro, revelou que o Serviço de Psicologia e Orientação desenvolve um programa de orientação vocacional com os alunos do 9.º ano de escolaridade.  “São realizadas sessões com o grupo turma ao longo do 1.º e 2º períodos, destinadas à promoção do autoconhecimento e à exploração do mundo do trabalho, bem como, ao tratamento de informação essencial sobre o sistema educativo português”, indicou.

Com o objetivo de promover o “desenvolvimento vocacional dos jovens, recorre-se ao uso didático de testes psicológicos, questionários, material audiovisual e fichas de trabalho elaboradas para esse fim. No término deste processo, são levadas a cabo entrevistas finais individuais, de balanço de todo o trabalho desenvolvido ao longo do ano, onde todos os pais e encarregados de educação são convidados a participar”, contou.

De acordo com o diretor, “este é um trabalho muito importante que pretende ajudar os jovens na construção dos seus projetos de vida e na tomada de decisão que têm que realizar no final do ano e que contempla ainda a participação dos alunos na iniciativa promovida pelo gabinete da juventude da autarquia “9.ºano e agora?” e no “Dia Aberto da Escola Secundária Rafael Bordalo Pinheiro” para conhecerem de perto as ofertas educativas e formativas”.

O diretor do Agrupamento de Escolas Josefa de Óbidos, José Santos, disse que “a orientação vocacional é uma prioridade e está adaptada às necessidades dos alunos”.

Encaminhou a resposta para Ana Inês Borges, psicóloga do Serviço de Psicologia e Orientação, que explicou que dinamiza “programas específicos para o 9.º ano, com o ‘Crescer como Ser: Eu Decido!’, e para o 12.º ano, com o ‘Sem Pressas’”.

“Estes programas, que foram desenhados à medida das necessidades dos alunos, incluem sessões individuais e em grupo, momentos de partilha entre alunos de diferentes ciclos de ensino e contactos com profissionais de várias áreas, promovendo o autoconhecimento e o conhecimento das diferentes ofertas educativas e formativas”, contou.

Segundo a psicóloga, um dos pontos altos é o evento Josefa Co(n)Vida, onde os estudantes interagem diretamente com representantes do ensino superior e das forças de segurança e armadas. “O nosso objetivo é apoiar os alunos na construção de um projeto vocacional sólido, promovendo decisões conscientes e fundamentadas para o seu futuro pessoal, escolar e profissional”, sublinhou a psicóloga.

“Os programas de Orientação Vocacional do Agrupamento são facilitadores e orientadores da construção do projeto vocacional dos nossos alunos, apoiando-os e promovendo escolhas e tomadas de decisão conscientes e fundamentadas, criando assim alicerces para o seu futuro pessoal, escolar e profissional”, adiantou Ana Inês Borges.

A psicóloga apontou ainda que há um guia que a Fundação José Neves lançou, para ajudar alunos e encarregados de educação a pensar na vida depois do ensino básico. “O guia traça um retrato do panorama do presente e do futuro do ensino, não descurando as consequências das diferentes opções”, concluiu.

Em declarações ao JORNAL DAS CALDAS, a diretora do Agrupamento Escolas de São Martinho do Porto Luísa Sardo, referiu que “ajudar os alunos a fazer escolhas informadas, conscientes e alinhadas com os seus interesses, competências e valores é um compromisso que assumimos com responsabilidade e dedicação”.

A psicóloga explicou que o programa de orientação vocacional inclui várias etapas fundamentais: sessões em sala de aula com metodologias ativas para promover o autoconhecimento, aplicação de testes vocacionais, entrevistas individuais e uma sessão informativa sobre o sistema educativo e os diferentes percursos formativos.

Os alunos participam ainda numa visita à Futurália – Feira de Educação, Formação e Empregabilidade e os pais são envolvidos numa sessão específica sobre a oferta educativa na região.

“Este programa decorre em articulação com os diretores de turma e as famílias, promovendo uma abordagem integrada e personalizada. Acreditamos que a orientação vocacional é essencial para preparar os jovens para os desafios do mercado de trabalho e para decisões conscientes ao longo do seu percurso académico”, destacou a psicóloga.

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